segunda-feira, 29 de agosto de 2016


CRIMES VIRTUAIS NO BRASIL

RESUMO

O presente artigo teve como escopo analisar os principais aspectos dos chamados “crimes virtuais”, sob uma ótica diferenciada, onde o foco é a impunidade desses crimes que em sua maioria não se tipificam na lei vigente brasileira. Para tal, revisou-se a evolução histórica das condutas e dos crimes que ao decorrer do tempo foram evoluindo antagonicamente à proporcionalidade das leis. A questão principal é a ausência de leis que tipificam os crimes cibernéticos que ocorrem com frequência em nosso cotidiano e que ainda não foram inseridos no ordenamento jurídico brasileiro. Levou-se analisar na legislação brasileira quais condutas são enquadradas como delito no ordenamento atual e aquelas que não estão enquadradas como crime. Por fim, uma análise das peculiaridades dos crimes cibernéticos e das leis brasileiras que quase sempre faz com que esses crimes se tornem impunes.


Palavras-chave: Crimes Cibernéticos, Tipificação Penal, Legislação.





ABSTRACT

This article had the scope to analyze the main aspects of so-called "cyber crime", under a different light, where the focus is the impunity of these crimes that mostly do not typify the Brazilian applicable law. To this end, it revised up the historical evolution of conduct and crimes which the course of time have evolved antagonistically the proportionality of the laws. The main issue is the lack of laws that criminalize cyber crimes that occur frequently in our daily lives and which have not yet entered the Brazilian legal system. It led to analyze the Brazilian legislation which conducts are classified as criminal offenses in the current planning and those that are not classified as a crime. Finally, an analysis of the peculiarities of cyber crimes and Brazilian laws that often makes these crimes become unpunished.


Keywords: Cyber ​​Crimes, Criminal Criminalization, law.





INTRODUÇÃO

No universo jurídico brasileiro nota-se a ausência de leis especificas para com os crimes oriundos do meio digital (internet) e sua aplicação às condutas ilícitas praticadas na sociedade digital. Na ausência de instrumentos jurisprudencial e legislativo a temática em questão é elemento, a nível nacional, de debates e discussões entre diversas esferas jurídicas no âmbito nacional e até mesmo tema internacional.
No Brasil, o tema necessita de uma análise aprofundada no intuito da elaboração de leis específicas quanto aos crimes virtuais, abordando seu conceito, delimitação o campo para que a jurisdição tenha eficiência, peculiaridades e identificação, assim como sua legalidade, visto que, na sociedade digital, os crimes digitais tornam-se habitualmente frequentes.
O universo do direito digital no Brasil busca a evolução quanto ao emprego de leis e uma nova perspectiva dos juristas para com as peculiaridades da internet e, quando possível, comparando-a com outros meios de comunicações.
Partindo desta premissa, surgem características particulares e divergentes, visto que a internet se tornou um ambiente livre, sem vigilância, e, por conseguinte, sem qualquer poder punitivo embasado em lei.
Em contrapartida, o Brasil já dera o primeiro passo, com criação da lei intitulada como “Lei Carolina Dieckmann”, em menção à atriz que teve suas fotos intimas vazadas na internet, prevê pena de seis meses a dois anos de reclusão se a violação resultar na aquisição de comunicações eletrônicas particular, segredos comerciais e informações confidenciais. “Aumenta-se a pena de um a dois terços se houver divulgação, comercialização ou transmissão a terceiro, a qualquer título, dos dados ou informações obtidos”, diz o artigo 154-A, do Código Penal.
A referida lei abriu um precedente no Código Penal Brasileiro, pois é considerada a primeira a conter artigos que abordam exclusivamente crimes eletrônicos. Segundo, Leandro Bissoli, especialista em direito digital, a Justiça tenta aprovar instrumentos similares há anos, porém sem sucesso. "A lei 12.737 chega atrasada e sem uma redação excepcional, mas é a primeira do gênero a ser aprovada. Com ela, preenchemos uma lacuna no nosso Código Penal."
O objetivo do referido artigo é obter esclarecimentos sobre os principais crimes virtuais no Brasil e seu possível enquadramento no código penal brasileiro, bem como obter uma visão ampla de todo o ordenamento jurídico quanto aos projetos de leis inerente aos referidos crimes.


1.   REFERENCIAL TEÓRICO

1.1 Conceito de Crimes Virtuais
O conceito de crimes virtuais entende-se com a violação de um sistema de informática no qual não se tem permissão para utiliza-lo, ainda aspirando a subtração, modificação e danificação de dados vitais para o funcionamento de um sistema ao qual se efetuou a invasão.
Uma acepção muito ampla de Crimes Virtuais é dada por Ferreira,
As várias possibilidades de ação criminosa na área de informática, assim entendida no seu sentido lato, abrangendo todas as tecnologias de informação, dos processamentos e transmissão de dados, originaram uma forma de criminalidade que, apesar da diversidade de suas classificações, pode ser identificada pelo seu objeto ou pelos meios de atuação, os quais lhe fornecem um dominador comum, embora com diferentes denominações nos vários países ou nos diferentes autores. (FERREIRA, 2005)

Ainda, segundo Ferreira (2002) “apesar das diferentes denominações o conceito de Crimes Cibernéticos pode ser identificado pelo seu objeto ou pelos meios de atuação”, já Rosa tem um conceito mais específico sobre Crimes Virtuais,
É a conduta atente contra o estado natural dos dados e recursos oferecidos por um sistema de processamento de dados, seja pela compilação, armazenamento ou transmissão de dados, na sua forma, compreendida pelos elementos que compõem um sistema de tratamento, transmissão ou armazenagem de dados, ou seja, ainda, na forma mais rudimentar; 2. o „Crime de Informática‟ é todo aquele procedimento que atenta contra os dados, que faz na forma em que estejam armazenados, compilados, transmissíveis ou em transmissão; 3. nos crimes de informática, a ação típica se realiza contra ou pela utilização de processamento automático de dados ou a sua transmissão. Ou seja, a utilização de um sistema de informática para atentar contra um bem ou interesse juridicamente protegido, pertença ele à ordem econômica, à integridade corporal, à liberdade individual, à privacidade, à honra, ao patrimônio público ou privado, à Administração Pública, etc. (ROSA, 2002)

Na visão jurídica, Crimes Virtuais podem ser delimitados, segundo Daoun e Lima (2012), “como ação típica, antijurídica, e culpável, cometida contra ou pela utilização de processamento automático de dados ou sua transmissão”.
As denominações quanto aos crimes virtuais são diversas, porém não há um consenso sobre a melhor designação para os ilícitos, crimes de informática, delitos de virtuais, fraude informática, em fim, os conceitos ainda não abarcam todos os crimes ligados à tecnologia.
Embora existam diversas inconsonância doutrinárias quanto ao conceito de crimes praticados em meio eletrônico, há uma grande parcela de doutrinadores que os conceitua como “crimes digitais”.

1.2 Histórico dos Ilícitos Cibernéticos

No mundo virtual há diversos ilícitos cibernéticos, sendo incerto estabelecer quando ocorrera a primeira ocorrência, não obstante há um entendimento entre escritores que os crimes virtuais tiveram início em meados da década de 60, conforme afirma Ferreira:

Ulrich Sieber, professor da Universidade de Würzburg e grande especialista no assunto, afirma que o surgimento dessa espécie de criminalidade remonta à década de 1960, época em que aparecem na imprensa e na literatura científica os primeiros casos de uso do computador para a prática de delitos, constituídos, sobretudo por manipulações, sabotagens, espionagem e uso abusivo de computadores e sistemas, denunciados, sobretudo em matérias jornalísticas. Somente na década seguinte é que iriam iniciar-se os estudos sistemáticos e científicos sobre essa matéria, com o emprego de métodos criminológicos, analisando-se um limitado número de delitos informáticos que haviam sido denunciados, entre os quais alguns casos de grande repercussão na Europa por envolverem empresas de renome mundial, sabendo-se, porém da existência de uma grande cifra negra não considerada nas estatísticas. (FERREIRA, 2005)


Em contrapartida, do que muitos presumem, a origem dos crimes virtuais pode não estar diretamente associado com o surgimento a Rede Mundial de Computadores (internet), assim sendo de acordo com Assunção,

Em novembro de 1961, desenvolvedores do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets) demonstravam o seu sistema experimental compatível com gerenciamento de tempo, o que permitia quatro usuários trabalhando em terminais rodar programas de outros usuários. No final dos anos 60, terminais conectados por modem poderiam ser facilmente invadidos, já que, na época, ninguém se preocupava em colocar senhas. (ASSUNÇÃO, 2008)

 Mesmo tendo como origem nos anos 60, os crimes passaram a ter maior visibilidade somente na década de 80, quando os atos criminosos acresceram substancialmente, conforme afirma Ferreira,
A evolução das técnicas nessa área e a sua expansão foram acompanhadas por aumento e diversificação das ações criminosas, que passaram a incidir, a partir dos anos 80, em manipulações de caixas bancários, pirataria de programas de computados, abusos nas telecomunicações, etc., revelando uma vulnerabilidade que os criadores desses processos não haviam previsto e que carecia de uma proteção imediata, não somente através de novas estratégias de segurança no seu emprego, mas também de novas formas de controle e incriminação das condutas lesivas. (FERREIRA, 2005)

No Brasil, segundo Nogueira (2008), o primeiro episódio de crime virtual ocorreu no ano de 1997, “ano este, em que um analista de sistemas fora indiciado pelo envio de e-mails com teor erótico, juntamente com ameaças a honra de uma jornalista”.
Outro crime virtual muito discutido no Brasil, ocorreu na cidade de Juiz de Fora (MG), quando computadores de uma universidade foram empregados para a divulgação de inúmeras mensagens de cunho racista e homofóbica em uma listagem de discussão sobre sexualidade, o caso foi intitulado como “Caso Rancora”.
 No exterior, o fato de maior repercussão foi a prisão do australiano Julian Assange, cofundador do site wikileaks, onde foi acusado de divulgar documentos de cunho sigiloso do governo norte americano. Ainda em se tratando de assuntos internacional, destaca-se a prisão do fundador do site de gerenciamento de arquivos Megaupload, Kim Schmitz, indiciado por práticas ilícitas de “pirataria on-line”.
Enfim, os ilícitos têm sido matéria de grande discussão, particularmente os ligados a ataques e vazamento de informações confidenciais em diversos sites de grandes instituições e órgão governamentais, ataques estes praticados por crakers fundamentados como respostas a possíveis transgressões de direitos, ou até mesmo realizados por opiniões distintas.

1.3Tipificação dos crimes virtuais

Um dos maiores obstáculos existentes na tipificação dos crimes virtuais é a concretização dos referidos ante ao enquadramento na legislação para com quem possui preponderância jurídica correta para julgar os delitos.
Na ausência de uma legislação própria, aquele que cometeu o crime informático deverá ser julgado com embasamento nas leis existentes do Código Penal. Assim sendo, elenco os possíveis enquadramentos de crimes virtuais praticados no Brasil.
I) Pirataria Virtual: Segundo o art. 87 da referida lei 9.610/98, "o titular do direito patrimonial sobre uma base de dados terá o direito exclusivo, a respeito da forma de expressão da estrutura da mencionada base". As penas possuem uma variação de 2 meses a 4 anos, podendo haver aplicação ou não de multa, a estar sujeito se houve reprodução parcial ou total, venda ou disponibilização ao público via cabo ou fibra óptica;

II) Sabotagem informática: Segundo Milton Jordão, "versa a sabotagem informática no acesso a sistemas informáticos visando a extinguir, total ou parcialmente, o material logo lá contido, podendo ser cometida por meio de programas destrutivos ou vírus". A lei apenas prevê punição de 1 a 3 anos de prisão e multa, porém não inclui a sabotagem informática em seu texto;

III) Pornografia infantil: O art. 241 do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) veda "apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar ou publicar, por qualquer meio de comunicação, de modo inclusivo na rede mundial de computadores ou Internet, fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito abrangendo criança ou adolescente";
IV) Apropriação indébita: O Código Penal faz menção apenas à apropriação indébita de bens materiais, como por exemplo Computador, impressora, sendo afastada a forma de apropriação de informações especificas. Conquanto, se a apropriação ocorrer através de cópias de software ou de informações que legalmente concernem a uma instituição, podem-se aplicar punições enquadradas na letra “a” deste artigo.

V) Divulgação de segredo: Não há menção no Código Penal caso o segredo seja revelado Internet, sendo tratado da mesma forma que se fosse divulgado por documento;

VI) Crimes contra a liberdade individual: São os enquadrados no Código Penal como crimes de ameaça (artigo 147), de inviolabilidade de correspondência (artigos 151 e 152), de divulgação de segredos (artigos 153 e 154) e de divulgação de segredos contidos ou não em sistemas de informação ou bancos de dados da Administração Pública (artigo 153, § 1º-A). Segundo

VII Difamação, injúria e calúnia: São os tipificados no (artigo 138), de difamação (artigo 139) e de injúria (artigo 140).  Os ilícitos são estimulados pelo preceito do anonimato, podendo suceder em ambientes virtuais. Outro exemplo a ser citado pode ocorrer nas Redes Sociais, quando o individua publica informações falsas que leses a reputação e dignidade de outro indivíduo.


As tipicidades apresentadas anteriormente evidenciam o quão a legislação é obsoleta ante às diversas modalidade de crimes. A legislação em questão não acompanha de maneira proporcional às transgressões ilícitas, podendo até ser favoráveis ao contraventor.


CONSIDERAÇÕES FINAIS
No presente artigo procurou-se apresentar a relação existente entre o direito penal e as novas relações que decorrem sobre indivíduos em ambientes virtuais. Realizou-se um rol dos principais tipos crimes virtuais que incidem na internet, ficando muito evidente o crescimento do número de criminosos que utilizar o meio virtual para a prática dos ilícitos
Foram apresentadas as principais situações de crimes virtuais no Brasil, trazendo em sua conjuntura a tipificação penal na qual aquela conduta se enquadra, qualificando-se, com isso, um ilícito penal. Toda a pesquisa realizada no referido estudo teve como intento maior apresentar as diversas formas as quais se pode realizar um crime através do ambiente virtual, sendo da forma punitiva mais flexível até uma possível restrição total da liberdade. Foram retratadas ainda, as lacunas na legislação referentes aos diversos crimes e a falta de um enquadramento dos mesmos na legislação brasileira.
Por fim, cabe destacar que o presente artigo não tem a finalidade de exaurir as matérias, o estudo dos ilícitos cibernéticos é relativamente novo, sendo que o presente visa apenas apresentar os aspectos que causam a difícil condenação de um “criminoso virtual”.
Sendo assim, recomenda-se para pesquisas futuras, um estudo das novas legislações sobre os crimes cibernéticos, com ênfase na adequação da legislação atual. Além de uma abordagem profunda dos novos paradigmas destes crimes, recomenda-se, ainda, que seja feia uma análise do impacto dessa nova legislação no julgamento dos crimes, comparando-os com os crimes já transitados julgados antes e após a elaboração das novas leis.


REFERÊNCIAS


ASSUNÇÃO, Marco Flávio Araújo. Segredo do Hacker Éticos. 2. ed. Florianópolis: Visual Books, 2008.

Brasil. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm> Acesso em: 01 mai. 2016.

Brasil. Estatuto da criança e do adolescente: Lei federal nº 8069, de 13 de julho de 1990. Rio de Janeiro: Imprensa Oficial, 2002.

Brasil. Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Direito autoral. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9610.htm> Acesso em: 12 mai. 2016.

DAOUN, Alexandre Jean; LIMA, Gisele Truzzi de. Crimes Informáticos: O Direito penal na Era da Informação. Disponível em: <http://www.truzzi.com.br/pdf/artigo-crimes-informativos-gisele-truzzi-alexandre-daoun.pdf>. Acesso em 28/03/2012.

FERREIRA, Ivette Senise. A criminalidade Informática. In: LUCCS, Newton; SIMÃO FILHO, Adalberto (Coord.) Direito & Internet: Aspectos Jurídicos relevantes. 2. ed. São Paulo: Quartier Latin. 2005.

LEI CAROLINA DIECKMANN entra em vigor nesta terça-feira. Veja on-line, São Paulo, 2 abr. 2013. Disponível em: < http://veja.abril.com.br/noticia/vida-digital/lei-carolina-dieckmann-entra-em-vigor-nesta-terca-feira>. Acesso em: 05 mai. 2016.

NOGUEIRA, Sandro D‟Amato. Crimes de Informática. São Paulo: BH Editora, 2008. P.29.

ROSA, Fabrízio. Crimes de Informática. Campinas: Bookseller, 2002.